Mobilidade Humana e Surdez: além das distâncias, em busca do pertencimento

São Paulo – A questão da mobilidade humana é um tema de profunda relevância e atualidade em nosso mundo globalizado. O fenômeno da mobilidade, seja por motivos econômicos, sociais, políticos ou ambientais, é uma realidade que molda não apenas as dinâmicas sociais, mas também os desafios e as oportunidades que enfrentamos como sociedade. A abordagem acadêmica e aprofundada desse tema torna-se então de extrema importância e o Instituto São Paulo de Estudos Superiores – ITESP oferece uma oportunidade para compreender as complexidades da mobilidade, suas implicações e seu papel na formação das comunidades globais, mas também fomenta uma discussão crítica e fundamentada sobre como enfrentar as questões relacionadas à mobilidade humana de maneira ética, justa e sustentável.

A pós-graduação em “Mobilidade Humana” promovida pelo ITESP está intrinsecamente ligada à relevância da questão migratória, um fenômeno global que demanda compreensão, estudo e ação eficaz. São João Batista Scalabrini, reconhecido como o “Apóstolo do Catecismo”, também era um visionário em relação às questões sociais e humanitárias de seu tempo. Assim como ele dedicou esforços incansáveis aos pobres, se preocupou com os trabalhadores sazonais e instituiu iniciativas para apoiar os surdos em 1879 refletindo um compromisso profundo com a assistência e o bem-estar dos necessitados, a pós-graduação em “Mobilidade Humana” busca abordar as complexidades da mobilidade contemporânea, incluindo a migração, refugiados e deslocamento forçado. Este enfoque está alinhado com a visão dos scalabrinianos de oferecer suporte integral às populações em movimento, garantindo-lhes assistência religiosa, social e sindical, promovendo uma abordagem humanitária e solidária para enfrentar os desafios da mobilidade humana na contemporaneidade.

O estudo sobre Mobilidade Humana busca trazer à luz não apenas as experiências daqueles que se deslocam geograficamente, mas também as jornadas que envolvem desafios linguísticos. É nesse contexto que a Prof.a Quezia Cavalcanti Alves da Silva, especialista em Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), compartilha um relato impactante sobre a mobilidade diária dos estudantes surdos na cidade de São Paulo. Para os estudantes surdos, o deslocamento assume uma dimensão peculiar, não apenas marcada pelos aspectos urbanos, mas profundamente entrelaçada com a questão linguística. Na cidade, há seis Escolas Bilíngues de Surdos (EMEBS), dispersas em diversas regiões, além de dois polos bilíngues. Esses alunos, provenientes de diferentes bairros da metrópole, enfrentam deslocamentos consideravelmente maiores se comparados aos estudantes ouvintes. Esse desafio é acentuado pelo fato de a maioria dos surdos ter nascido em famílias ouvintes, o que implica em uma comunicação complexa, onde vale ressaltar que a Educação para Surdos tem como premissa o uso da Língua de Sinais (LIBRAS) como primeira língua, e o Português é ensinado como segunda língua, na modalidade escrita, reforçando a importância de políticas educacionais inclusivas e de apoio à comunidade surda. Esta realidade ressalta a necessidade urgente de uma abordagem inclusiva e consciente sobre a mobilidade humana, não apenas considerando a infraestrutura física, mas também o aspecto linguístico para garantir igualdade de acesso e oportunidades.

A mobilidade humana ganha contornos particulares no âmbito educacional, revelando histórias de dedicação e superação. Na EMEBS Prof.ª Neusa Bassetto, situada na Mooca, esse fenômeno se manifesta de forma notável. Alunos surdos que residem em regiões distantes, como Guaianazes, Itaquera, São Mateus e arredores, percorrem entre 20 a 30 km diariamente para alcançar a escola. Esse deslocamento considerável é impulsionado pela necessidade de utilizar a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), uma língua de modalidade visual. A EMEBS se torna mais do que um espaço educacional é um “território linguístico” onde a LIBRAS cria um laço de pertencimento, permitindo vivências enriquecedoras e aprendizado. Além dos deslocamentos nacionais, a escola recebe estudantes surdos vindos de Angola e Bolívia. A comunicação desses alunos é um desafio, pois muitos deles chegam sem uma língua consolidada. Os pais utilizam suas línguas nativas ou dialetos regionais, e a língua portuguesa muitas vezes não é o meio principal de comunicação. Contudo, o ambiente inclusivo da escola promove uma imersão propícia para o desenvolvimento da LIBRAS, permitindo que os alunos estrangeiros se integrem e adquiram linguagem de maneira surpreendentemente rápida. Essas narrativas realçam a importância da inclusão linguística e reforçam a necessidade de uma abordagem sensível e inclusiva na pós-graduação “Mobilidade Humana”, promovida pelo ITESP, para enfrentar desafios tão singulares e enriquecedores na mobilidade cotidiana.

A professora Quezia Cavalcanti Alves da Silva compartilha uma perspectiva esclarecedora sobre a mobilidade humana no contexto dos estudantes surdos. Em sua abordagem, ela salienta a complexidade da comunicação enfrentada pelos alunos surdos imigrantes. Na dinâmica escolar, esses estudantes utilizam a LIBRAS para se comunicar enquanto escrevem em Língua Portuguesa. Esse cenário é desafiador, pois muitos de seus familiares utilizam línguas orais estrangeiras e não possuem conhecimento de LIBRAS. A autenticidade dessa mobilidade vai além de distâncias físicas e rotas geográficas. Seja por motivos permanentes ou temporários, forçados ou voluntários, a mobilidade humana dos sujeitos surdos é permeada por uma necessidade fundamental: pertencimento.

Ao explorar a noção de pertencimento a uma cultura e um grupo social, percebe-se que a mobilidade humana ganha um significado mais profundo quando se trata dos surdos. O desejo de pertencer e conectar-se é evidente nos grupos de surdos que compartilham espaços religiosos. Muitos atravessam a cidade para participar de cultos e reuniões, impulsionados pela necessidade de acesso linguístico nas igrejas e pela busca por um ambiente onde se sintam acolhidos e conectados a uma comunidade que compartilha a mesma língua e cultura.

Assim, a mobilidade humana dos surdos é um fenômeno multifacetado, sendo moldada por diversos fatores, especialmente questões linguísticas. As experiências individuais e únicas desses sujeitos enriquecem essa discussão, ressaltando a importância de considerar essa perspectiva na abordagem da pós-graduação “Mobilidade Humana” promovida pelo ITESP.

Por: Arison Lopes, Comunicação Institucional ITESP e  Prof.a Quezia Cavalcanti Alves da Silva

Imagem: Comunicação ITESP

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